Obra estava sendo erguida ao lado de um córrego. Clarão na mata denunciava que novas casas seriam construídas no local, de onde foram suprimidas vegetações e árvores de mais de 12 metros de altura
São Sebastião (SP) – Uma casa em pleno processo de construção foi demolida na manhã desta quinta-feira (30) no Sertão do Piavú, no bairro de Cambury, em São Sebastião, litoral norte de São Paulo, por estar sendo erguida na divisa da Unidade de Conservação APA (Área de Proteção Ambiental) Baleia/Sahy, e fora dos limites da Zeis (Zona de Especial Interesse Social) criada no local. Trabalhadores da Regional Costa Sul da Prefeitura de São Sebastião, por meio da Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Urbanismo, com apoio da Polícia Militar e da Guarda Municipal, colocaram abaixo a estrutura de um barraco e seu alicerce.
A denúncia já havia sido feita no ano passado à prefeitura e à Polícia Ambiental pelo ICC (Instituto de Conservação Costeira), co-gestor da APA Baleia/Sahy, que preparou um minucioso laudo apontando as diversas irregularidades e os danos já causados na floresta.
Segundo a presidente da entidade, Fernanda Carbonelli, os “proprietários” dos imóveis, identificados como sendo dos estados do Ceará e da Bahia, já são reincidentes, já que uma demolição já havia sido feita no dia 7 de julho do ano passado. “A área estava sendo loteada e alguns lotes já tinham sido vendidos. Tudo clandestinamente”, frisou a presidente.
Funcionário da prefeitura retira telha do local onde barraco foi demolido
Segundo ela, no ano passado, durante a demolição, uma construção continuou erguida e outras acabaram se multiplicaram no local. Nesta quinta-feira (30) havia três casas. Duas delas foram demolidas e outra será desmontada em data a ser agendada pela fiscalização da prefeitura. No local há claros indícios de que novas construções surgirão por ali, pois há diversos tipos de materiais de construções, madeiras e até uma rua estava sendo providenciada para facilitar o acesso ao loteamento. No momento da fiscalização, os moradores das casas ainda retiravam seus pertences.
“O processo é basicamente simples. Os invasores escolhem um local, fazem a limpeza da área, plantam bananeiras, depois realizam o corte de árvores e iniciam o parcelamento do solo para comercialização”, explica o engenheiro agrônomo André Motta Waetge, do Instituto de Conservação Costeira, responsável pelo levantamento dos danos ambientais provocados pelo loteamento clandestino.
Moradores retiram geladeira antes da demolição
Os principais danos ambientais constatados pelo engenheiro referem-se à supressão de vegetação em estágio avançado de Floresta Alta de Restinga e de Floresta Paludosa, com abertura de vias e de parcelamento de solo. Um “clarão” na mata é observado quando se chega ao loteamento, onde pode ser constatado o corte de diversas árvores, algumas delas com mais de 12 metros de altura. Um córrego passa bem próximo às construções.
Para a presidente do ICC, se as medidas não fossem tomadas, o impacto ambiental seria irreversível. “Isso resultaria também no comprometimento da recém-criada Unidade de Conservação – APA Baleia Sahy”, reforça.
Crescimento desordenado – Diversas ações são realizadas pelo ICC para evitar o crescimento desordenado na região sul de São Sebastião, onde encontram-se os últimos resquícios de Mata Atlântica preservada no Estado de São Paulo e no Sudeste brasileiro, um dos últimos remanescentes florestais do planeta. Essas ocupações irregulares surgem da noite para o dia, sem as mínimas condições estruturais e ausência total de esgotamento sanitário. Muitas dessas moradias são erguidas em áreas de risco ou à beira de rios.
Moradoras filmam ação dos funcionários da prefeitura durante demolição
Levantamento feito pelo ICC revela que em quatro anos, a região cresceu 62% somente na Baleia Verde, bairro próximo ao local da demolição, em relação às últimas décadas. E o cenário é preocupante: a previsão é que o crescimento seja 10 vezes maior nos próximos anos, caso nada seja feito. A APA Baleia/Sahy possui mais de um milhão de metros quadrados e abrange cinco importantes ecossistemas, além de mais de 87 espécies de animais catalogadas com algum grau de instituição.
O lugar é um refúgio natural que atrai turistas o ano inteiro. Mas nos últimos anos, milhares de pessoas se mudaram para a região, iniciando-se um crescimento desordenado. A burocracia do Poder Público contribuiu para o crescimento dessas construções irregulares, ameaçando o colorido das matas, aumentando a criminalidade, tudo isso aliado à falta de infraestrutura e à poluição de rios e praias.